Atividades na horta promovem autoconhecimento e respeito nas relações interpessoais

Nos fundos da Associação Beneficente Semear – unidade Parque Via Norte – o amplo gramado leva até uma horta vistosa e bem cuidada, onde as 120 crianças e adolescentes atendidos pela entidade aprendem sobre os cuidados com as hortaliças e a importância de uma alimentação saudável. Para além disso, a iniciativa desenvolve a autoestima e o respeito interpessoal.

Assim é o fundamento do trabalho da oficina Ser e Essência, que procura fortalecer a inteligência emocional dos atendidos pela entidade, que é parceira da Fundação FEAC. Dessa maneira são incentivados aspectos como o pensar antes de agir e reagir, o respeito, trabalho em equipe e altruísmo.

Arthur Arruda Alves, educador social responsável pela oficina, definiu uma maneira eficiente e criativa para desenvolver na prática o conhecimento sobre inteligência emocional trabalhado com as 120 crianças e adolescentes de 6 a 14 anos atendidas pela entidade: cuidar e cultivar da horta da Semear.

Segundo o educador, metade do tempo de duração da oficina é dedicado à sala onde conceitualmente é trabalhado o material lúdico e colorido doado pelo Instituto Cury, que se baseia na metodologia multifocal  e a escola da inteligência, que incentiva e desenvolve a educação socioemocional. O restante da oficina é, na prática, desenvolvida no quintal da entidade, onde uma atraente e organizada horta é cultivada com mais de 10 variedades de hortaliças.

“Na horta, eles colocam em prática tudo aquilo que aprenderam na teoria. Para os cuidados com as plantas, como o plantio, a rega das mudas, a limpeza do quintal, as crianças precisam trabalhar em equipe, planejar a atividade e praticar a gentileza entre os colegas. O interesse que eles têm pelo cultivo da horta acontece naturalmente”, explicou Arthur.

Os resultados de todo esse trabalho são crianças mais respeitosas, tolerantes, pacientes e empáticas. De acordo com o educador social, uma das principais preocupações da equipe da Semear é a continuidade do trabalho desenvolvido com as crianças em outros ambientes em que vivem. “Além dos resultados nítidos no dia a dia aqui na entidade, também temos o retorno de familiares e professores das escolas onde estudam. Os casos de agressões entre eles e os conflitos interpessoais tiveram uma queda muito grande”, explicou Arthur.

Com isso, a horta também passou a ser melhor cuidada e os pequenos responsáveis por ela já sabem quais são as tarefas que devem ser feitas para a manutenção das hortaliças, realizadas diariamente. Os atendidos também têm a responsabilidade de cuidar do Cenourinha, o coelho que vive no quintal da instituição e recebe todo o carinho e dedicação das crianças, que diariamente trocam a água e se certificam que há ração suficiente para o pet.

“Gosto de cuidar da horta porque aprendi que temos que cultivar os alimentos para que nunca faltem e nossa saúde não seja prejudicada. Também aprendi aqui que é preciso ajudar os outros e ser gentil quando alguém também nos ajuda”, disse Vinicius Rafael Grigolin Soares, 10 anos, que assim que termina suas tarefas na horta, se junta aos colegas no parquinho que também fica nos fundos da instituição.

Ao fim das atividades realizadas na oficina são feitas rodas de conversa. Neste momento, o educador social se reúne com as crianças e adolescentes no pergolado que fica ao lado da horta para discutirem sobre o que deu certo durante as ações desenvolvidas e o que ainda precisa de aprimoramento. Dessa maneira, eles melhoram a convivência com o hábito do diálogo e pensam em ações futuras.

Além de participarem de todo o processo de plantio, cuidados e colheita, as crianças também preparam e consomem o que é produzido na horta, por meio de outra oficina da Semear, a Pequenos Chefs, que assim como a Ser e Essência e todas as outras atividades realizadas na instituição, se baseia na metodologia multifocal e inteligência emocional.  Integradas, as oficinas incentivam as crianças a terem hábitos mais saudáveis e a experimentarem alimentos antes nunca provados. Outro resultado positivo foi a diminuição do desperdício de verduras e legumes durante as refeições consumidas na instituição.

Com os bons resultados alcançados com as atividades na horta, a equipe da Semear já pensa em aumentar a variedade de hortaliças com o cultivo de variedades como tomate e erva cidreira. Os cuidados com árvores frutíferas e o cultivo de um jardim com flores e plantas ornamentais também estão nos planos da turma.

Somando esforços, as famílias dos atendidos fazem sua parte e sempre ajudam na horta. Alguns doam mudas, outros adubo, e muitos têm o interesse de participar. O que as crianças aprendem na oficina que lida com a horta é multiplicado em suas famílias, estreitando assim o vínculo familiar e os momentos de interação entre crianças, adolescentes e pais. Este retorno positivo sempre chega à instituição, principalmente nas reuniões que envolvem os familiares.

Foco na cidadania

Segundo Ariane Ferrarezzi, pedagoga da Semear, a ideia de incluir a horta nas atividades desenvolvidas com as crianças e adolescentes foi não só para trabalhar a questão da alimentação saudável, mas principalmente despertar a consciência do autoconhecimento e de que tudo tem seu tempo: seja na germinação de uma semente ou em relacionamentos interpessoais.

Para trabalhar a metodologia multifocal e a escola da inteligência em suas atividades, a equipe da Semear participou de formações no Instituto Cury. Dentro desta linha de trabalho que é aplicada desde 2016, a instituição realiza uma semana pedagógica em que são definidos os temas que serão trabalhados com os atendidos durante o semestre. Atualmente, o que permeia todas as oficinas é a questão do autoconhecimento. Dessa forma, a equipe consegue integrar as diferentes ações culturais, esportivas e outras desenvolvidas nas 11 oficinas oferecidas pela instituição, em uma mesma metodologia de trabalho.

“A base dessa metodologia é a educação socioemocional, que trabalha a questão das emoções e sentimentos com as crianças. A primeira lição que aprendem é pensar antes de agir. Quando começamos a aplicar isso, já gerou uma diferença no comportamento dos atendidos que frequentam a instituição. Antes o educador não conseguia resolver os casos de conflito, que sempre chegavam até a coordenadoria. Hoje isso não acontece mais, porque as próprias crianças e jovens já conseguem resolver os conflitos interpessoais por si só”, explicou Roberta Dantas de Oliveira Santos, coordenadora geral da Semear.

Para Carla Nascimento, assessora social da FEAC, os resultados positivos da oficina ressaltam o quão relevante são as concepções preconizadas para o desenvolvimento das atividades do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. Os efeitos também refletem na vida cotidiana dos usuários, já que o trabalho é desenvolvido com foco e de acordo com a Política de Assistência Social.

“O trabalho em grupo e o diálogo em rodas de conversa propiciam o fortalecimento das convivências e casam com as estratégias e engrenagens propostas para esse serviço da Política de Assistência Social. A Associação tem apresentado nessa oficina resultados bem positivos, que revelam um trabalho de planejamento cuidadoso e coerente em torno das ações”, analisou Carla.

Graças ao êxito do trabalho, a entidade se destacou entre as 80 instituições que aplicam a teoria multifocal no país. Em Campinas, a Semear é a única instituição social que desenvolve esta metodologia. A equipe da entidade já planeja o próximo passo do trabalho social, que é estender ações baseadas na metodologia multifocal às famílias dos atendidos. Assim, os profissionais acreditam que os resultados serão contínuos e duradouros.